O estado de São Paulo detectou um aumento de 144% dos casos de hepatite A entre janeiro e agosto em comparação com o mesmo período do ano passado.
Segundo a Secretaria de Estado da Saúde, foram notificadas 427 infecções, ante 227 nos primeiros oito meses de 2022.
Também houve duas mortes relacionadas à doença. No ano passado, foi registrado um óbito.
O cenário estadual se reflete, principalmente, na capital, onde 225 pessoas haviam sido diagnosticadas com a doença até 28 de setembro, segundo um alerta epidemiológico do Cievs (Centro de Informações Estratégicas em Vigilância em Saúde), emitido na semana passada.
Essa alta no número de casos no município foi observada desde abril, atingindo o pico em julho, estabilidade em agosto, seguida de queda em setembro.
A hepatite A é uma infecção viral que provoca inflamação no fígado. A maioria dos quadros se resolve espontaneamente, sem sequelas, mas uma minoria dos pacientes pode ter complicações severas, incluindo a necessidade de um transplante e até morte.
Apesar do aumento significativo do número de notificações, o médico Victor Passarelli, infectologista pela EPM/Unifesp (Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo), destaca que o cenário não pode ser classificado como um surto neste momento.
“Ainda não se consegue definir como um surto, porque ainda não se viu uma correlação entre todos os casos ao mesmo tempo. É um fenômeno que tem que ser observado, analisado e investigado adequadamente, como está sendo. Mas vemos ainda como um aumento no número de casos.”
O estado não divulgou informações sobre o perfil dos infectados. Na cidade de São Paulo, entretanto, os pacientes são em sua maioria homens (73,3%), com idade entre 18 e 39 anos (71,6%).
Em 73,8% dos casos, a fonte de transmissão não foi identificada, fator que dificulta a compreensão do que está causando essa elevação do número de infecções.
As principais formas de contrair hepatite A são por meio da ingestão de água ou alimentos contaminados com fezes de uma pessoa infectada ou por relações sexuais.
A infecção pela via sexual aparece em apenas 6,2% dos registros, e a contaminação por meio de água ou alimentos, em 15,5%.
A infectologista Umbeliana Barbosa, do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, na capital, lembra do surto de hepatite A entre 2017 e 2018, quando houve 684 e 483 casos por ano, respectivamente.
Naquela ocasião, identificou-se uma predominância da transmissão sexual (26,6%), afetando principalmente o grupo HSH (homens que fazem sexo com homens), algo que até este momento não foi constatado pelas autoridades sanitárias paulistas.
Umbeliana avalia que, possivelmente, haja um percentual maior de pacientes infectados após relações sexuais.
“Na cidade de São Paulo, no estado, onde o saneamento básico é considerado de alta qualidade, a água que abastece nossos domicílios é considerada de alta qualidade. Na minha opinião, esse percentual de transmissão sexual provavelmente é mais representativo, está sendo subestimado.”
Passarelli frisa que “qualquer pessoa que tiver exposição relevante ao vírus pode desenvolver a infecção” caso não tenha sido vacinada nem adquirido a doença previamente.
É nesse contexto que se tornam fundamentais medidas preventivas, especialmente em relação à higienização das mãos e dos alimentos que consumimos.
“Uma pessoa com hepatite A que não fez uma higiene adequada das mãos pode contaminar um alimento. Se ela trabalha em um restaurante, por exemplo, esse alimento pode contaminar muitas pessoas”, alerta Umbeliana.
Ela cita também a importância da higienização anal após a evacuação e do uso de preservativo em relações sexuais e o risco da prática de sexo oral anal.
“O vírus é eliminado em altas concentrações nas fezes de indivíduos contaminados, antes mesmo de os sintomas começarem. Contamina água, mãos e objetos.”
Os especialistas enfatizam a importância da imunização como forma de proteção individual e coletiva.
“A vacina de hepatite A inativada provou estar entre as mais imunogênicas, seguras e bem toleradas. Aproximadamente 100% das pessoas desenvolvem níveis protetores de anticorpos contra o vírus no prazo de um mês após uma única dose da vacina”, afirma o Cievs.
Porém, durante a pandemia de Covid-19, muita gente que procurou a vacina não a encontrou.
“De 2020 a 2022, houve um desabastecimento de vacina de hepatite A, inclusive nas clínicas privadas. Isso também contribuiu para que esse processo de prevenção pela vacina sofresse uma defasagem. Precisamos aproveitar esse momento — os dados epidemiológicos mostram isso”, diz a médica do Emílio Ribas.
Passarelli ressalta que, “em momentos como esse, realmente temos que estimular a vacinação na população em geral, principalmente de pessoas que nunca tiveram contato com o vírus, que são suscetíveis à infecção”.
A vacina contra a hepatite A faz parte do calendário de imunização do SUS para crianças de 1 a 5 anos desde 2014, com apenas uma dose.
Adultos são imunizados com duas doses em um intervalo de seis meses.
Na rede pública, os seguintes grupos também são elegíveis:
• portadores de hepatopatias crônicas de qualquer etiologia, inclusive portadores do HCV (vírus da hepatite C) e portadores crônicos do HBV (vírus da hepatite B);
• indivíduos com coagulopatias;
• pacientes com HIV/Aids;
• com imunodepressão terapêutica ou por doença imunodepressora;
• com doenças de depósito;
• portadores de fibrose cística (mucoviscidose);
• portadores de trissomias;
• candidatos a transplante de órgão sólido (cadastrados em programas de transplantes);
• transplantados de órgão sólido ou de células-tronco hematopoiéticas (medula óssea);
• doadores de órgão sólido ou de células-tronco hematopoiéticas (medula óssea);
• cadastrados em programas de transplantes; e
• indivíduos com hemoglobinopatias.
A imunização dos adultos elegíveis no SUS em todo o estado de São Paulo deve ser feita nos Cries (Centros de Referência para Imunobiológicos Especiais). A lista dos locais pode ser consultada aqui.
Pessoas que estejam fora desses grupos mas desejam se imunizar contra a hepatite A podem buscar a rede privada.
“O que a gente tem indicado, para quem tem a possibilidade, é tomar a vacina em clínicas particulares, se a pessoa puder arcar com os custos, independente se tiver ou não alguma comorbidade”, afirma Victor Passarelli.
O preço por dose varia entre R$ 150 e R$ 300 na cidade de São Paulo, conforme uma busca feita pela reportagem em farmácias e laboratórios.
As informações são do Portal R7.
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